sexta-feira, 27 de agosto de 2010

O de todo dia

Hoje eu sou o Zé que para e olha o sol queimar a pele e as retinas, que só pisca quando a nuvem cobre a claridade vinda do céu. O Zé que adentra com medo do futuro incerto, e mesmo que seja certo ainda há um vestígio de medo.
Um Zé que se renovou do ontem na simplicidade de se amanhecer. Como qualquer outro que se renova no que acredita.
Eu sou o Zé que desacredita um pouco em tudo, que veste o mundo. Que tem cores amargadas, que às vezes cheira a vômito, a fome e suor.
Sou o Zé que tem sempre um penar no coração. Sempre um amor no coração. Sempre sangue no coração. Sempre vivo.
E que deita pra dormir pensando em todos os segundos, em todos os ‘porquês’, em todas as conversas do dia.  E só pensa em acordar num dia bem melhor. Que não reza, mas que acredita nos sonhos que faz, mas que quase não sonha – e que não se pense que seja por falta de amor.
Um Zé que sangra quando é machucado e que às vezes tem olhar perdido.
O Zé da construção.
Que constrói seu amor, sua vida, que constrói o mundo onde quer pisar.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Começo de tarde

À tarde que se sopra em tons meio claros, por trás do Ray Ban e das cortinas meio envelhecidas das casas por onde passa. Num caminho firme, dum chão que de cimento vai virando terra, com passos firmes, um olhar perdido nas notas de piano francês que ecoam em seus ouvidos.
O sol está meio ameno.
Só pensa em chegar em casa e trancar-se nas paredes do seu quarto. Livrar-se desse mundo que só quer se desfazer de sua felicidade.
Ele se cala diante do mundo que pode esmagá-lo. Cala-se por que simplesmente não tem mais forças. E espera até estar novamente firme para mostrar o quão forte é.
Ele sorri de uma satisfação de vingança consumada. Como se previsse um futuro incerto.
E antes ele percebe: o amargo da sua língua – é a loucura lhe comendo as vísceras.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Rotina

Meus dias andam os mesmos: os mesmos passos, a mesma cor meio-alegre.
Ando meio sujo de tanto me usar igual dia após dia após, dia após. E isso me cansa de mim. Uma vontade de me deixar em casa, de beber uma vodka pra despertar. Ou dormir até a pele descascar e se renovar.
Sem horas.
Sem minutos.
É a querença de ser novo, de inconstância. Não falo de mudar o jeito de ser ou quem se é, falo de mudar o pouco do ser, um algo, um mínimo.
Ser um pouco novo dia após dia após, dia após.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Carolina

Carolina é nome mágico. Que é um crime reduzi-lo a Carol: cortá-lo ao meio sem pudor. Como certas luzes que não se deixam meio acesas. Como amores que não se come pela metade.
Carolina é simples, é intenso, é íntimo. É pra quem se ama, é pra quando se ama.
Carolina é pele leve.
Carolina é de se agasalhar e confortar e se aquecer.
Carolina é de se ver pela janela em dia de sol.
Carolina é de sorriso, como certos olhares que nos deixam tímido e nos fazem perder o caminho.
Carolina não se reduz. Não é de metade.
Carolina é inteiro.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Ontem

Uma lágrima escorreu na noite. Outra escorreu na cama. E mais sobre o travesseiro. E mais no lençol.
Era noite. Fria.
O coração é cheio de lágrimas antigas, que quase nem se lembra de onde vieram.
E todo esse tempo sem chorar foi mantido num sorriso não falso, mas necessário.
Houve felicidades verdadeiras, completas, mas não se é pra sempre assim.
A noite traz o sono, e ele ameniza a dor.