domingo, 24 de junho de 2012

acorda

Sem aquele destino certo que o tempo parecia ter lhe prometido, ou o próprio que ela mesma se prometera, ela descansa-se na beira do caminho. A poeira toma (de) conta só do vento se passear. No cesto ali jogado, leva as roupas, uns livros, os retratos salvos, o que há de se comer, o que há de se viver e chorar.
Ela descansa o corpo e os olhos da poeira. Solta os pés da obrigação de sustentar sua carne magra e a cesto que carrega os seus. A rudia desfeita enxuga o suor. Não sei se ela se recupera do cansaço de viver ou de andar – ou se isso mesmo se faz diferente.
Vivê-la é um bocado grande.
O vestido encarnado é a quebra do tom pastel disso. Vê-se de longe o colorido unicolor. Qualquer olho vibra ao perceber. Ela se limpa da poeira que lhe pousa, sacode a cabeça e os cabelos desgastados postos entre a liberdade e a prisão. Levanta os olhos e avista o sol – à vista – que lhe queima.
É hora de ir simbora. Que o mundo é bem o momento onde seus pés estão. Que todo amor é apenas o que seus olhos verão.

terça-feira, 12 de junho de 2012

é um dia, maria

Entra junho e entram os santos. Maria enfeita o terreiro de frente de casa com as bandeirinhas coloridas. Aprega um prego no muro, outro no cajueiro, puxa o cordão dali e outro prego, outro cordão e tudo vai se colorindo.
Já é quase dia de Santo Antônio e só agora é que ela se pôs a enfeitar a casa. É que Maria andava adoentada, de cama por mais de uma semana. Só agora é que botou os pés no chão, pôde enfeitar a casa e botar o santo casamenteiro de cabeça pra baixo. Lá no altar de madeira, o Santo Antônio via Maria de ponta-cabeça rezando de manhã bem cedo, no dormir do sol e no dormir do corpo. E não era de se espantar se ela sonhasse que estava fazendo outra reza.
É que Maria gostava do cheiro das fulô que perfumava a casa, mas queria também o cheiro de outra pele, um xamêgo, um calor atrás da orelha.
Ela não se sentia tão só, mas não se sentia tão muita.
Naquela tarde passou o tempo a cozinhar o milho, amarrar pamonha, cantarolar o forró do rádio, alimentar esperança. A madeira da fogueira já pronta se molhava pela chuva fina de meio de ano. Ela olha pela janela no desejo de que estie. Mas é só chuvisco de sol partido entre nuvens. Logo ele se apodera do mundo.
Forma-se arco-íris.
Agora é lua, são estrelas e o céu limpo. Já dá pra ouvir o barulho dos fogos, o pé-de-serra lá mo palhoção, o cheiro das fogueiras e do milho assando. E já são horas de fim de esperar pelo amor chegar. Maria acende a fogueira pra clarear e se esquentar, senta no tamborete e espera a noite findar. Até lá o Santo Antônio fica de pés no ar pro acaso do amor pedido chegar. E espera, que a esperança sempre lhe vestiu. E não é coisa que se acabe com o apagar da última brasa. Maria tem o coração aceso.