domingo, 27 de junho de 2010

Pode ser de nós dois

Bom, agora eu quero braços: envolvendo. E os dedos deslizando pelo meu corpo calmo, solto do mundo. Porque eu quero estar solto do mundo. Quero estar pequeno. É que ando tão grande de viver nesses dias.
Despenco no chão de teu corpo, que é quente de vida. E os braços agarram, envolto.
E o meu ouvido em teu peito, me fazendo escutar o coração, que sei, que sim, que bate também por mim. No ritmo dos minutos passando, lento, aperto tua mão e as unhas se encravam na minha pele.
Eu sangro de amor.
Eu quero sangrar de amor. Me corte com a língua, me refugie nos seus dentes, me segure no silêncio. Eu que sou agridoce.
O cheiro exalado é de felicidade. Sente?

quinta-feira, 17 de junho de 2010

De Clarice 1

Sou composta por urgências: minhas alegrias são intensas, minhas tristezas, absolutas. Me entupo de ausências, me esvazio de excessos. Eu não caibo no estreito, eu só vivo nos extremos. Eu caminho, desequilibrada, em cima de uma linha tênue entre a lucidez e a loucura. De ter amigos eu gosto porque preciso de ajuda pra sentir, embora quem se relacione comigo saiba que é por conta-própria e auto-risco. O que tenho de mais obscuro, é o que me ilumina. E a minha lucidez é que é perigosa.

Clarice Lispector
(não há certeza da autoria)

quinta-feira, 10 de junho de 2010

E quando chove...

Em um cômodo quase cinza com uma janela que traduz o estado do mundo, os pingos desenhando seus destinos no vidro.
Dá pra sentir o cheiro da chuva de longe. Aquele cheio de terra molhada. Aquele cheiro de pé enlameado, de sol se escondendo, de vontade de ficar agasalhado. Aquele cheiro de frio.
O mundo parece ficar mais contido, mais necessitado de ser. E as cores densas.
Eu, então, sinto um desejo de me recolher. Ficar assim, com olhos calmos, com tudo que se mais quer – várias coisinhas pequenas que parecem ter mais gosto quando há chuva. Tudo que poderia levar numa mochila ou que me coubesse na mão: tudo que meu coração pensasse instantaneamente.
Acordar as horas que em tempo assim – fechado – parecem mortas. Elas se molham e ficam pesadas de se correr. Ativar o sangue que engrossa e espreguiça. Lento: o coração bombeia. Lento: o coração ama. Não que por ser lento, seja menos. Na chuva meu coração ama lento. E ama mais.