terça-feira, 25 de janeiro de 2011

relógio

    Haverão de inventar relógio acoplado ao coração que faça as horas correrem e ‘devagarem’ na necessidade que realmente se precisa. Porque coração é que realmente sabe de tempo. Poder estender uns minutos em horas quase infinitas ou mesmo o contrário: daquela hora indesejável passar como relâmpago – mesmo que se deixe marca, que é tão rápido que se sofre menos.
       Haveria também de dar tempo ao coração, para quando este precisar-se se reconstruir, se adaptar a não-rotina de fins de relacionamentos, a não correspondência de sentimentos. Coração é que sabe de tempo.    
       Coração é que sabe da gente.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

lembrança

    Hoje passeei sobre mim, sobre uma caixa de lembranças que me fizeram sorrir – mesmo algumas tristes.
    Há um ano escrevia meu primeiro texto para o blog, e me lembrei de todo o sentimento e a felicidade que me fez escrevê-lo. Cada detalhe físico e imaginativo daquela manhã, como se fosse um dia tão importante de se lembrar, mas que não me é especial – ao menos que eu saiba. Lembro daquela felicidade boba que foi se despedaçando no caminho de volta para casa. Lembro do chocolate que comprei para presentear o aniversariante do dia e que adoçou as lágrimas que me caíram.
    E nas outras lembranças me vi alegre, e triste, e pasmo, e perdido. Tanta coisa, quase nenhum arrependimento.
    Era como comer tudo aquilo que vomitei um dia, e tudo tinha um gosto de mofo, de coisa antiga. De que tudo passou, e que eu mudei. E que hoje minha felicidade não é tão efêmera.
    E agora eu vomito o vômito comido de mim mesmo.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

felicidade essa

    Tenho uma felicidade espreguiçada, sustentada pelo que ainda não tenho fisicamente, mas que me tange à pele. Felicidade erguida de sonhos ou ilusões. Guardo essa felicidade dentre a carne de mim, para protegê-la como mãe que protege filho; que o mundo pode querer destruí-la, e eu não confio tanto no mundo. Que essa felicidade ainda é lânguida para se sustentar só.
    E preparei todo um coração, todo um corpo como fortaleza para proteger, para acalmar essa explosão de se nascer feliz. Cuidei do que vingou, limpei os menores vestígios, resquícios do tempo que não valem bem à pena. E pronto: estou.
    É hora de nutrir o que se quer comer, e deixar morrer o que se quer matar, e de deixar descansar o que não é de agora e anda esgotado (ah, às vezes eu me canso como se estivesse eternamente vivo).

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

a coisa

    Coisa que me nasce como sabor de coisa já nascida. Talvez seja coisa renovada. De novos ares, perspectivas, ilusões. Digo, coisa não menos perigosa que antes fora coisa antes, coisa verdadeira. Coisa de se arriscar mais, por ser mais distante e inacreditável à pensamentos enraizados.
    Não se diz nome – não pelos ares poluídos – para não se perder o instante inteiro.  Mas mesmo assim se diz, porque se precisa do momento do som. Precisa-se ver a coisa entrar pelos olhos e dançar pelas veias. Há quem agüente nascimento de coisa tão.
    Há quem se perca nos caminhos friáveis. Eu sou indignado diante da coisa.
    Coisa: amor.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

virgínia

    Virgínia, que era perdida, disse: “eu te amo.”
    Otávio, que era pleno: “que te amo também.”
    Mas eles eram distantes, em espaço. Ele que era de lá, ela que era dali. Mas eram íntimos. Sabiam que eram isso.
    E Otávio precisou voltar de onde veio, e lá havia quem lhe fosse mais perto, mas não mais íntimo. E havia quem quisesse lhe ser mais íntimo. Mas as possibilidades, que Otávio se deixaria pelas possibilidades.
    Virgínia esperava que Otávio pedisse para que ela largasse tudo e se jogasse ao mundo, se jogasse a ele. Mas Otávio apenas soltou-lhe a mão. E talvez Otávio esperasse que Virgínia mesma se soltasse, ou que também, ela lhe segurasse a mão mais forte e lhe puxasse pra perto de si para o sempre que há. Mas Virgínia apenas soltou-lhe a mão.
    Virgínia que chorava sob a pele, sorriu de consolação e Otávio guardou-lhe o sorriso.
    Eles nunca mais foram os mesmos de si.
    Acalma-se, coisa tua.

sábado, 8 de janeiro de 2011

volume no cérebro

    "A pesquisa mostrou que os mesmos eventos físicos são percebidos por algumas pessoas como se fossem mais ruidosos, brilhantes, rápidos, odoríferos ou coloridos do que para outros [...] Em algumas pessoas, o volume é elevado no máximo, amplificando a intensidade de todas as experiências sensoriais. Essas pessoas são chamadas de ‘amplificadores’. [...] Um nível que provoca leve desconforto em “amortecedores” pode significar intenso sofrimento para “amplificadores”. [...] No outro extremo, o “amplificador” é um introvertido que evita a existência agitada do “amortecedor”. Ele é do tipo que se queixa do volume do rádio, do tempero da comida, do caráter berrante do papel de parede. Se puder escolher, ele prefere ficar sozinho, quieto, em ambientes desertos."
(desconhecido)

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

violência de um coração

    É de mim fazer planos. Ilusões perigosas para vidas meio vazias. (E é tão perigoso quando se quer quase um tudo). Mas eu tenho uma intensidade tão grande como felicidade de cão ao dono, que foge do controle por muitas vezes. Então. Eu piso em vidros, piso em feridas, piso errado, piso sem querer. E há uma hora que é tarde demais (porque tudo que existe tem sua hora de ser tarde demais), e não há como voltar porque simplesmente sou incorrigível.
    Sou incorrigível.
    Sou incorrigível.
    Sou quase-corrigível.
    Meu coração é violento. Inerte e paralítico de espaço – logo ele que tanto quer voar. Descascado de anti-sentimentalismo, impróprio para olhos profundos. E esse chão árido, que às vezes dói os pés. Coração humano intolerante intolerável. Excessos impregnados nas tintas descascando-se. Coração humano (às vezes cerebral).
    Estou tentando esquecer o que é esquecível. Estou esperando Maio, com a felicidade que ele me promete.