quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

prece

Pro pescador:
bom tempo
lá no alto mar.
Para o mar:
Caymmi e Iemanjá.
Para a ciranda:
Lia de Itamaracá
na beira-mar.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

ciranda pra lia

Eu quis fazer uma ciranda
encantada e azul
para dar à Lia
 morena cirandeira –
pra ela cantar
como a renda
a uma rendeira.

Minha ciranda
só existe
se Lia cantar.

Minha ciranda
só é ciranda
se o mar abençoar.

Lia, vem ver
minha ciranda rodar
com cheiro de laranjeira
e os pés molhados das águas do mar.

sábado, 19 de janeiro de 2013

dona maria sem terra

Nas andanças dos dedos, e dos olhos (e das linhas que os arrodeiam), há o peso de todo chão pisado. A pele ressecada pelo sol, de cor queimada de sol, transparece todo o muito tempo em espera do próprio tempo que não chega. Seus olhos fixos na janela aberta que da à vista a estrada-sem-fim de terra batida, que nem os olhos de quem perdeu ao mar e espera que as águas salgadas tragam de volta. Confunde-se com esperança, mas logo se acostuma à dor. Das mãos que às vezes não sabem o que fazer ou dos dentes que não sabem mais sorrir.
A vida às vezes também não sabe o que quer. Há uma flor já despetalada e ressecada no vaso. Resquícios de outono ou outubro. Já nem se lembra mais. Nem que flor era, nem que tempo é. Nem a própria flor sabe de si, porque houve um abandono de tudo, até do sentimento mais absurdo e essencial.
Não há um chão que conte de seu. Desde pequena, recém-parida, porque veio no sangue, que deu o nome – nome-próprio – de batismo e de destino. Não é questão de dinheiro, é coisa de corpo, de não ser, de sina. Por mais alto que seja, nunca haverá nuvens aos olhos. Por mais morta que esteja, não haverá cova que seja sua. Que nem a terra grudada nas suas unhas lhe pertence.
E todo chão que pisa é invasão. Seu único ter é o próprio corpo: latifúndio. E os sonhos – que os olhos fechados lhe permitem viver.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

efervescer

Pierre Verger  - Recife (1948)
Quem muito ferve
se evapora.

Eu,
quando fervo:
frevo!

domingo, 6 de janeiro de 2013

cana

Um quartinho pra passar a dor
e umedecer as feridas
no fígado e no peito.