De lá do alto
da ladeira vem descendo o colorido anunciado em estandarte. São amarelos e
confetes e serpentinas que pintam o céu e plumas e azuis. Vem descendo as
fantasias cheias de alegrias e aquelas tristezas indissolúveis de carnaval. Para
cada sorriso, um dente é desilusão.
Descem as
mulheres com seus vestidos bordados, em lantejoulas e paetês. As mãos
espalmadas ao vento e nas sapatilhas que recobrem os pés deslizam em lirismo.
Entre todas, está
Nara. Seguindo e rodopiando pelo frevo e o asfalto. Nara, tão branca e de cabelos
tão negros quanto o céu dessa noite, às vezes se perde entre a melodia que
entra e que sai ou no girar daqui que dá em passo pra lá. Em seu peito há um coração
tatuado. Contração sincopada.
Os postes iluminam
de quase-nada as ruas emaranhadas que agora se recobrem de paralelepípedos.
Entre os meios-fios: o bloco e Nara de sorriso breve. Só avista os coloridos
das casas enfileiradas, entre os olhos que observam, e seus pensamentos
flutuantes de lembrança. Houve um beijo roubado naquele baile da Rua São
Domingos. Ela numa máscara veneziana e ele brincando de papangu. Sua mão leve.
Agora, o bloco
segue sozinho em meia-luz dobrando a esquina. Agora, Nara segue em nuvem. Ela
chora enquanto canta o frevo entoado pela orquestra de pau-e-corda. Há um frevo
de saudade.