sábado, 18 de dezembro de 2010

inteira mar

Quando Cecília mergulhou no mar, as ondas estavam mais puras. Soltas, as estrelas quebravam a escuridão intacta. Seu sangue inerte e fraco de possibilidades e amarelo de sol a questionava da sua sina de mulher.
    Cousa de ser apática com gente, seus olhos azuis fugiam de outros olhos de mesma cor certeira. De jeito certeiro também era seu sorriso de quem cresce sonhado.
    Quando Cecília sorriu pro mar, ela sonhava intempestivamente. Cecília amarga de desilusão, mergulhou como se o mar a chamasse para uma dança eterna. As águas apenas tocadas pela lua que quebrava. A lua apenas observava, voyeur desse sexo íntimo, inerente.
    O prazer de Cecília era doce sujo de carmim. Como pecado proibido intimamente, de vísceras infectadas e em começo de putrefação. Cecília que não era Clarice, que não era Carolina, que não era Maria, que às vezes não era nem Cecília: morria. Morria como quem respira. Morria como se morrem tantos outros. Mas, diferente: sabia que morria.
    Quando Cecília estava sob o mar, o sal temperou sentimentos restantes. E como sua pele brilhava. Parecia ter na pele todo um céu tatuado.
    Quando Cecília entrou no mar, o vento eriçou-lhe todos os pelos, como só um homem ao cantar Chico Buarque ao pé de seu ouvido na cama encharcada de suor havia feito.
    Quando Cecília boiou no mar – seus pulmões cheios de água e sal – seus olhos fixos na lua feita só para ela. Um sorriso seco, ondas cansadas. Cecília era inteira mar.

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